Das melodias subconscientes e dos autoplágios (continuação)

Há quase 3 anos, fiz um post intitulado “Das melodias subconscientes e dos autoplágios”. Nele, comentei que quem ouve muita música, mas, especialmente quem é músico, obviamente vai formando uma biblioteca musical na memória que aumenta continuamente. Assim, minha discussão ali foi sobre como saber se uma ideia para uma composição é algo original, criação própria, ou se é resquício de alguma melodia já ouvida anteriormente e que ficou armazenada no subconsciente?

Naquele post falei de trechos de músicas do Wonkavision, do Queen e do Brian May. Mas, o fato é que, na época, eu tinha um exemplo de autoplágio que era o principal pra mim, mas, sei lá por que, acabei esquecendo de citar. Desde então, queria corrigir essa falha. Mas, além dessa, acabaram surgindo mais algumas, incluindo indicações do meu querido amigo Rodrigo Guimarães (devidamente indicadas).

Então, aqui vão mais exemplos desses casos.

Prince x Prince

O primeiro caso, que pra mim é gritante (e que é o que eu esqueci de citar no outro post) é o do Prince. Em outubro de 1982, ele lançou uma música chamada “1999”, do seu álbum de mesmo nome. Nem sabia, mas, pesquisando, descobri que este álbum está na lista dos 200 álbuns definitivos no Rock and Roll Hall of Fame e foi o primeiro álbum do Prince a ficar entre os top 10 da Billboard. Além disso, foi o quinto álbum mais vendido em 1983.

Em janeiro de 1986, as Bangles (um dos meus grupos favoritos ever) lançaram a música “Manic Monday”, que foi um estrondoso sucesso à época, incluída no álbum “Different Light” (meu primeiro das Bangles e o que me fez me apaixonar por elas). Como consta nos registros, o compositor de “Manic Monday” é Christopher. Só que, de fato, Christopher foi o pseudônimo utilizado pelo compositor da música, que é ninguém mais que Prince!!

Fato é que, pra mim, Prince conscientemente se autoplagiou em “Manic Monday”, só dando uma roupagem nova. Ouçam:

1999 (aos 0:35 do vídeo)

Manic Monday

 

David Foster et alli x Zélia Duncan

Em março de 1999, foi lançado o single de “The Prayer”, belíssima música composta pelo premiado David Foster com Carole Bayer Sager, Alberto Testa e Tony Renis. A música foi gravada por Andrea Bocelli e Celine Dion e incluída na trilha sonora de “Quest for Camelot”. Aliás, a primeira vez que ouvi a música foi na apresentação do Oscar, para o qual a música concorreu, e me apaixonei de cara. Além de a música ser linda, me tocou em especial o jeito atencioso que a Celine Dion demonstrou para com o Andrea Bocelli, para ficarem perfeitas as partes em que cantavam juntos.  A música não ganhou o Oscar, mas ganhou o Golden Globe e, no ano seguinte, também um Grammy.

Ano passado, ouvi uma música lançada então recentemente (maio de 2019) pela Zélia Duncan, chamada “Breve Canção do Sonho”. A música é linda, mas, de cara me bateu aquela sensação de “já ouvi isso antes”. Demorei um pouco e percebi que era de “The Prayer”. Pesquisando, descobri que a música, apesar de lançada pela Zélia Duncan em 2019, havia sido incluída na trilha sonora da novela Cheias de Charme, da TV Globo, de 2012.

É menos óbvio que o caso do Prince, mas, ouçam:

The Prayer

Breve Canção do Sonho

 

Deep Purple x Queen

Essa “semelhança” foi notada pelo meu amigo Rodrigo e acho muito interessante.

Em março de 1972, o Deep Purple lançou a música Highway Star. Por sua vez, no ano seguinte, o Queen lançou a música My Fairy King, composta por Freddie Mercury. Embora as músicas não tenham nada a ver entre si, a introdução tem uma semelhança bem impressionante, não só pelo ritmo, mas pela extrema “coincidência” do grito agudo que, no caso do Deep Purple, não sei dizer quem fez, mas, no caso do Queen, foi o baterista Roger Taylor. Ouçam:

Highway Star

My Fairy King

 

Buddy Holly x The Beatles

Em outubro de 1958, Buddy Holly lançou a música “Raining In My Heart”, diversas vezes regravada, inclusive pelo Status Quo (em 1976), com a qual conheci a música. De novo, ao ouvir, tive a sensação de “já ouvi isso antes”.

Depois de quebrar um pouco a cabeça, me toquei que estava lembrando de Dear Prudence, composta por John Lennon (e creditada a Lennon-McCartney) e lançada em 1968, no famoso Álbum Branco.

Nesse caso, apesar da lembrança da melodia, acho que me chamou atenção também a similaridade de parte da letra:

Raining in My Heart (Buddy Holly):
The sun is out, the sky is blue
There’s not a cloud to spoil the view

Dear Prudente (The Beatles)
The sun is up, the sky is blue
It’s beautiful and so are you

Raining In My Heart

Dear Prudence (aos 0:17 do vídeo)

 

Lynyrd Skynyrd x Scorpions

Essa foi mais uma sacada do meu amigo Rodrigo. Em 1973, a banda Lynyrd Skynyrd lançou a música “Simple Man”. Já o Scorpions, em 1979, lançou a música “Always Somewhere”. O arranjo das guitarras e do baixo são muito semelhantes. Ouçam:

Simple Man

Always Somewhere

Mais impressionante ainda, como notou o Rodrigo, na versão ao vivo, os Scorpions mudam o tom para o mesmo tom de Simple Man:

Righteous Brothers x Grease

Pra terminar, essa é uma das mais impressionantes semelhanças. E, de novo, de músicas que, cada uma, fez um enorme sucesso. Neste caso, eu diria que o trecho em questão é muito mais conhecido na gravação de 1978, na música Summer Nights, do queridíssimo filme Grease, composta por Jim Jacobs e Warren Casey e cantada por John Travolta e Olivia Newton-John. Quem não reconhece na hora quando começam os acordes da música?

Summer Nights

Mas, o mesmo trecho praticamente aparece, menos acelerado, na também famosa “You’ve Lost That Loving Feeling”, que eu conheci em 1989 com a gravação de Bill Medley para a trilha sonora de Top Gun. Acho que é comum as pessoas ouvirem a música e, no meio, falarem: “mas que caras de pau! Copiaram de Grease na cara dura!” Mas, na verdade, a música foi originalmente composta por Phil Spector, Barry Mann e Cynthia Weil e gravada em 1964 pelos Righteous Brothers!

You’ve Lost That Loving Feeling (Righteous Brothers)

You’ve Lost That Loving Feeling (Bill Medley)

Ou seja, é a música de Grease que copia o trecho dos Righteous Brothers! 😀

That’s all, folks!